sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Sobre a morte e suas conseqüências.

Ela apagou com voracidade seu cigarro no cinzeiro prateado, já engolido por tantos outros cigarros apagados. A chuva caia devagar do outro lado da janela, mas não fazia frio, talvez. Ela não sabia, na realidade, estava no conforto da sua cama fazia muito tempo, para se dar conta ao que acontecia do lado de fora da sua fortaleza inatingível.

Entre um cigarro aceso e outro apagado, ela se lamentava não entender direito a vida. O sentido dela, para ser mais sincera. A vida de tantos vai e vêm, de tantos “não sei o que estou fazendo aqui”. Sobre uma hora estar aqui e outra não mais.

Afinal, o que era não estar mais aqui? Era simplesmente não estar? Era partir para uma melhor e encarar um céu cheio de coisas boas, onde maldade não existe e você consegue, de fato, descansar em paz? E aqueles que ficam na Terra? Encontram conforto? Encontram abraços capazes de expelir – mesmo que aos poucos – a dor amargurada no coração? Será que parar de chorar por alguém que já se foi era sinônimo de esquecimento ou simplesmente de compreensão, o simples fato de “continuar vivendo”.

A chuva não se calava, tão pouco diminuía, machucava ao bater no vidro cansado do quarto da garota. O dia havia se transformado em noite, devido a tantas nuvens negras que cobriam o céu. E mais uma vez a garota esmagou seu cigarro no cinzeiro, talvez com raiva demais, para perceber que havia espalhado cinzas para todo o lado.

“Morrer não dói”, disse inutilmente para si mesma, esperando que isso a reconfortasse de alguma dor. Seus pensamentos estavam absortos na simples pergunta do que é desaparecer da vida. O que isso significava morrer, se era algo doloroso ou simplesmente cair numa escuridão. Num esquecimento da vida.

Quantas coisas deixamos para trás afinal, mesmo enquanto estamos vivos. Esquecemos dos que eram “melhores amigos”, nos tornamos apenas mais um na multidão que segue. Agora para onde segue... Quem sabe, não é mesmo? Melhores amigos se tornam estranhos, afinal, e poucos são os que restam. No final, provavelmente, definhamos de tantas vontades deixadas de lado, por falta de esforço, falta de vontade.

Era um pensamento triste - a garota pensou - ficar imaginando o que é a morte e sobre o que se trata não estar mais em vida. Mas eram apenas pensamentos, que aquele dia cinzento a fazia ter. Pensamentos medíocres – talvez -, mas mesmo assim intrigantes.

Ela então suspirou uma última vez para a chuva e ao fechar as cortinas para aquele dia feio e triste, disse para si mesma: “ao menos ele se foi num dia de sol. Era um bonito dia”.

Curitiba, 1º de outubro de 2010. 15:33

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Um ano atrás.

Eu tinha descido do avião, estava eufórica. Não entendia quase nenhuma palavra de italiano, havia perdido uma das minhas duas malas, estava cansada, com calor e com fome. Não tinha ideia do que fazer e queria me derramar em lágrimas, me desesperar. Mas no fundo, lá no fundo, eu estava bem. Assim como todos estávamos.

Não demorou muito para aqueles quatro primeiros dias na Itália se tornarem alguns dos mais bonitos da minha vida. Era meu sonho cada pedacinho daquele lugar.

Hoje eu ignoro tudo o que sofri. Ignoro os dias que passei a chorar e também os dias que desejei mais que tudo, voltar pra casa. Eu tive meu tempo e dentro do meu possível, eu fiz dele inesquecível. Cada dia que acordei na Itália se tornou único.

Dos sorvetes que tomei, dos cappuccinos de toda tarde, dos deveres e provas nunca feitos, das viagens que tive a sorte de fazer, das pessoas que conheci, das cidades que se tornaram brancas pela neve, da árvore de Natal montada fora de casa, do ano novo diferente, das compras, das cervejas que bebíamos sem perdão e até das escapadas pela janela, mesmo sabendo que não era preciso. Disso e mais um pouco, eu sinto falta.

Saudade de falar em italiano, de passar o dia em Venezia, de me apaixonar por Verona e contar os dias para chegar a Roma. De conhecer a Bélgica e nem perceber que eu estava conhecendo outro país. De brincar e de sorrir, de chorar e desabafar. Saudade de guardar uma saudade imensa e de escrever inúmeros textos, esperando que assim minha dor se desviasse.

Saudade da minha Itália e de tudo o que eu vivi, de tudo o que eu ousei viver. Das experiências que eu tive e mais ninguém teve, da fé em mim mesma que perdi no começo e depois de um tempo, comecei a recuperar.

E há exatamente um ano atrás no Brasil eram 17:42, e na Itália já eram 22:42. Eu estava fazendo amigos, me divertindo, contando histórias e rindo muito, estava vivendo minha primeira noite na Itália, a primeira de muitas. Há exatamente um ano atrás eu estava começando uma aventura, uma vida. Estava começando um novo capítulo, único e especial. Inesquecível.


"Magari volevo essere in Italia per un'attimo. Il paese più bello, la mia mancanza infinita."

Curitiba, 1º de setembro de 2010. 22:46

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Os (ex) melhores amigos.

Já não era de se estranhar tudo de repente desaparecer como se não fizesse mais sentido para ambos. Depositamos brigas acumuladas aos longos de três anos e agora despejamos um no outro querendo atingir, ferir. Irmãos, melhores amigos, ou seja lá o que éramos, do que nos chamávamos, mas era real ou pelo menos foi, até as diferenças começarem a abrir uma passarela larga e comprida, entre nós dois. Acho que não éramos e nunca fomos tão fortes quando imaginávamos, o quanto gostaríamos de ter sido, amigo.

Cada dia que passa eu revejo nossos passos e percorro velhos baús de lembranças. Procurando qualquer coisa, qualquer placa que sinalizou inutilmente: “está próximo de acabar”, sinais que pelo qual não vimos, não enxergamos. E perdoamos um ao outro, quando as feridas sangravam, quando não fazia sentido algumas atitudes, comportamentos...

Deixamos de lado tantas palavras sinceras, quando se magoava, que deixamos a vida fluir de maneira absurda. Não nos tornamos fortes, apenas construímos uma muralha de areia esperando as ondas do mar chegarem para desmoronar tudo o que construímos ao longo de três anos.

Acho que você tem razão, errei. Mas você também errou e deixamos tudo errar ao mesmo tempo, deixamos chover tudo o que estava guardado. Tempestades nos atingiram e não recorremos um ao outro, fugimos para lados opostos. Nos acolhemos pela primeira vez em braços diferentes. Deixamos o mundo desmoronar entre a gente.

E no final de cada dia eu peço inutilmente para que tudo tome forma novamente. Mas peço em vão, afinal. Fomos traídos por nós mesmos, derrotados por nós mesmos. E mesmo que me doa admitir e perceber isso, eu me acostumei com a sua solidão ao meu lado.


Curitiba, 25 de agosto de 2010. 21:08

domingo, 1 de agosto de 2010

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"Se è tardi per trovarmi, insisti, se non ci sono in un posto, cerca in un altro, perchè io son fermo da qualche parte ad aspettare te".

- Walt Whitman


Belle parole, davvero belle.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Uma fala.

- Me faça dormir no seu colo, encare meu rosto com aquele seu olhar que eu adoro, respira junto comigo e veja as estrelas na mesma direção que eu. Agüenta firme quando vierem tempestades e segura minha mão, para andarmos juntos nos dias de verão. Sonhe junto de mim e se permita amar tanto assim, toca meu coração com seus dedos quentes. Fale sobre a eternidade, a nossa eternidade.

Curitiba, 26 de julho de 2010. 20:23

domingo, 18 de julho de 2010

Entre três amigos e três vidas diferentes.

Éramos os melhores, os maiores. Mais vivos e mais unidos. Sorriamos juntos e na mesma sintonia, tínhamos mais planos e mais sonhos. Éramos iguais, mesmo que com objetivos totalmente diferentes. Mas crescemos sem estarmos de mãos dadas e o tempo nos foi tomado quando os dias se tornaram meses e assim, se tornou um ano e pudemos então apenas seguir em frente. Caminhamos para um vazio onde deixamos de ser quem éramos e nos tornamos quem somos. Vivemos na ausência um do outro e, infelizmente, aprendemos a viver sem os encontros uma vez por mês. Éramos vários e eu contava os dias para subir num avião, num ônibus ou em qualquer coisa que me trouxesse de volta para aquela cidade que me fazia tão bem. Os dias nunca eram o bastante e o tempo deslizava rapidamente das nossas mãos. Mas uma hora não podíamos mais fazer sentido, assim como não fazemos agora. Era necessário que nos tornássemos outros e carregássemos histórias que não quiséssemos contar e talvez nem os outros ouvirem. Fomos diminuindo e com o tempo, nossos corações não tinham mais lugar para tantos. Restaram-nos fotos e histórias, lembranças de uma mente que não as quer apagar. Estamos velhos e desimpedidos, cada um está num lugar onde o céu é maior, aquele céu que tanto falávamos e hoje encontramos. Estamos regando flores e colorindo um arco-íris, esperando voltar a ser o que costumávamos ser, quando estávamos juntos: três idiotas tomando a “última” cerveja numa mesa de bar e enfeitando risadas e vidas com alguns figurantes que iam e vinham.

Já fomos melhores juntos.

Estrada de volta para Curitiba, 14 de julho de 2010. 18:45

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Realidade não-real.

“Eu tive um sonho ruim e acordei chorando”, talvez cantasse Cazuza para mim, se me visse acordando com os olhos lacrimejados esta manhã. Sonhei com aquele desespero de perder, não para o nada, mas para outra pessoa. Minha respiração estava trancada, desesperada, meus olhos encharcados de lágrimas e meu coração palpitava freneticamente, como se o mundo estivesse ruindo, se perdendo.

Chego a conclusão que odeio sonhos que parecem reais, que demoram para serem “apenas sonhos” quando acordamos. Às vezes, afinal, sonhos podem machucar mais do que a realidade, pois acordamos desnorteados, assustados. Achando que tudo aquilo que sonhamos e não tivemos o mínimo de controle para acontecer, era real. Aquele real cru, daquela realidade nua e crua que tanto sabemos odiar.

Esta manhã quando abri meus olhos, eles estavam marejados por uma maré de lágrimas, meu coração apertado por uma dor irreal, uma dor de perda falsa. Porém, tal falsidade era tão perfeita que parecia verdadeira, doía até mesmo perceber que era mentira. E demorou, demorou muito tempo para eu descobrir que era o sonho e que a perda não ocorreu, que a briga não aconteceu e que meus gritos arranhados, eram simplesmente confrontos silenciosos na minha cabeça.

No entanto, logo veio o alivio. Me situei em meu quarto, em minha cama e um lugar vazio ao meu lado. Vazio simplesmente porque não havia ninguém deitado e não porque ninguém queria deitar. Aí então, as coisas foram tomando forma e o sonho foi desaparecendo, o coração foi se acalmando, a agonia persistiu nos minutos seguintes e ainda prende a respiração ao lembrar das lágrimas escorridas no rosto.

Era apenas um sonho, onde situações dolorosas ruíram um mundo falso-imaginário. A realidade diante desta situação pareceu mais doce, mais viável. Ainda mais quando o alivio se comprovou, quando o som do telefone invadiu o quarto silencioso e o coração entendeu perfeitamente que tudo estava bem, tinha sido apenas um sonho e agora não fere mais.


Curitiba, 1º de julho de 2010. 16:01

sábado, 19 de junho de 2010

Depois de quatro anos, de novo futebol.

Enfim, chega depois de quatro longos anos, uma nova edição da Copa do Mundo. O mundo inteiro se petrifica e cada país participante do campeonato se colore com as cores de sua bandeira. O Brasil, buscando seu lugar ao hexa, não é diferente. Talvez seja o único momento em que somos patriotas, provavelmente, é a única oportunidade em que temos de vestir o verde e o amarelo e desfilar com orgulho por aí. Afinal, de futebol o Brasil entende.

Lembro-me perfeitamente da última copa, em junho de 2006. O sol quase quente iluminava aquelas tardes em que Curitiba parava e a única coisa que restava, eram os gritos da torcida brasileira anunciando um novo gol. Eu, no entanto, pouco me importava. O jogo começava e eu procurava qualquer coisa para fazer, afinal, parar o mundo para ver um mísero jogo me enojava.

As tardes daquela Copa de 2006 eram ensolaradas, assim como as tardes deste 2010. O frio raramente vinha e se acontecia de vir, bastava um moletom para se esquentar. Aquele junho tinha sido um mês maravilhoso e nos meus 14 anos, na época, o mais certo era aproveitar aquelas tardes de sol de inverno em qualquer lugar. Até mesmo iluminando uma boa fotografia.

Quatro anos mais tarde, neste 2010 interessante, me vejo um pouco mais apaixonada por essa tal Copa do mundo. Me parece mais interessante assistir aos jogos e saber quem ganhou, mesmo quando não é o Brasil quem joga. E é fato, todo “quase gol” eu digo “ahhh”, como um verdadeiro espectador amante de futebol.

E deste longo período de quatro anos que se passaram, muitas coisas aconteceram. Hoje talvez eu pense que o que mudou nesses anos na minha vida, me fez ficar mais intrigada com esse Mundial. O fato de perceber que ao assistir o jogo, é uma boa maneira de fugir da aula ou até mesmo de reunir os amigos, me animou. Deixar colorir as coisas de verde e amarelo. Torcer junto por um país, apenas para se divertir, rir com os amigos.

Afinal, ver esse sol de todo dia iluminar esses jogos, tem sido interessante. Deixando esse junho um pouco mais gostoso e delirante. Fazer como meu amigo disse “que façamos barulho, que bebamos, mas que isso seja um motivo para reunir os amigos, exatamente como um dia foi”.


Curitiba, 19 de junho de 2010. 17:25

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Sobre outono e saudades.

Saudade do outono inventado por palavras encantadas dos meus autores preferidos. Outono cinza, com folhas secas jogadas ao chão, um ar frio correndo por todas as direções, levantando vestidos e afugentando cães. Roubando chapéus e destruindo rosas. Outonos perfumados por cappuccinos e bolos recém-assados. Saudades das palavras sólidas e quase amargas sobre o outono. Vontade de rever, mesmo que em pensamento, a estação de recomeço. Rever aquela rua perto do rio e do parque, coberta de folhas que pelas quais pisei com tanta vontade, apenas para ouvir o quase imperceptível som do “clack”. Caminhar entre aquelas ruas marrons, afogadas por prédios antigos e sentir no rosto um vento gélido, porém reconfortante. Saudade de respirar outono, enquanto deixava a lareira sutilmente queimar a madeira e fingia não ver o tempo passar ao ler um livro que me levava diretamente para casa. Saudade do outono descrito através das palavras dos sábios, apaixonados pelas folhas secas, ventos gélidos e cafés no final da tarde.


Curitiba, 26 de março de 2010. 21:43

domingo, 23 de maio de 2010

Algumas brigas, claro.

Às vezes deduzo que é um tipo de regra, existir entre casais essas brigas desinteressadas e dolorosas. Onde nunca ninguém ganha e provavelmente, sempre os dois perdem.

Acontece que é provocante a tentação de poder duelar com o seu amante. Poder discutir coisas inúteis dentro de contextos sem nexo, apenas para ver quem se cala primeiro. Afinal, em horas assim, se calar é divino.

O silêncio, é sábio. Assim que você se irrita o bastante a ponto de se calar, você escolhe não falar bobagens. Essas palavras ditas da boca pra fora, que mais machucam. Palavras nada sinceras, que a boca apenas cuspiu porque o cérebro mandou sinais de “agora eu preciso ganhar”.

Brigas são necessárias até mesmo quando nascem de uma estupidez, como tortas e bolos ou o sono de esperar dentro do carro. Brigas são apenas brigas, palavras infelizes que ousaram sair dos pensamentos, com uma nítida intenção de apenas ferir, no caso de casais, ambos.

Porém, penso que amar seja isso. Seja a capacidade de se calar depois de uma discussão, haver olhos inchados querendo escorrer e mil pensamentos fervorosos. Mas de repente, querer apenas dar um abraço forte e dizer “eu te amo”.

Brigas, afinal, é amor. É sinal de que se importa. “Algumas brigas claro, mas isso é tão normal quando se quer alguém, como eu quis você”, diria o Hateen. E sigo com esse pensamento, é natural e saudável brigar. Faz bem duelar durante alguns minutos, com quem você mais ama.

E vai ser assim, brigando aqui e ali, tendo raiva por segundos e depois amando dez vezes mais. Querendo calar para não falar bobagens, pois o medo de perder a pessoa amada é bem maior que o medo de perder a briga.

- Qualquer dia te faço tortas e durmo no carro te esperando. Você até mesmo pode falar alguma bobagem ruim.


Curitiba, 23 de maio de 2010. 23:10

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Sem título.

Sem antes pensar, lá vem ele outra vez, pegar na mão da menina cujo os olhos brilham só para ele. O mundo dela então balançava, como se fosse numa suave brisa, como se o mundo jamais fosse acabar. Era uma porção de amor, de calma. Um pedaço dela era ele e vice-versa. Criação de sonhos, ou seja lá o que fossem, davam motivos a mais para o dia-a-dia se tornar menos doloroso. Pois doer dói, qualquer hora, qualquer dia, disso a menina jamais duvidaria. Doeria na saudade, nas discussões, na ausência de vontade de continuar. Mas amaria sempre um pouco mais, deixando valer a pena aquele brilho nos olhos. Deixaria ser pra sempre o tal amor.

Curitiba, 10 de março de 2010. 22:43

sábado, 24 de abril de 2010

Descasos atatos entre nós de corda.

Vício sereno, das coisas, de você. Vício dos vendavais bem planejados, dos destroços esquecidos pelo mundo afora. Vício do simples sonho, do simples lugar tão mais distante para nós. Do lugar mais impossível. Vício do errado, incorreto e proibido. Das almas dilaceradas, dos portos abandonados e mares enraivecidos. Vício dos primeiros dias, das primeiras luzes, do primeiro nós. Nós dois.

Abstratos sentimentos umedecidos com solidão momentânea e de vez em quando, até mesmo com um pouco de incerteza, desinteresse. Águas passadas que às vezes voltam apenas para dizer “bom dia” e causar chuvas de dias, que machucam as tantas esperanças feridas. Sentimentos encharcados de vida, luz, cor. Obsoleta maneira de dizer ao coração cansado de tantas derrotas, que o caminho certo é só seguir em frente, caminhando entre as armadilhas e dentre a floresta densa.

Somos parte do ontem, do hoje, do amanhã. Do nunca, do para sempre, mesmo que sejam idéias ludibriadas. Recolhemos as certezas, incertezas. Os jamais. Degolamos vontades, ultrapassamos resquícios de uma memória boa, porém passada. Percorremos o espaço, talvez até alcançássemos a velocidade da luz. Alcançássemos um lugar maior, mais vasto. Mas óbvio.

Bastardos de uma própria fúria, de um coração queimando em chamas, em calor. Uma vontade de ser mais, de ter mais. Obstruímos detalhes prováveis, deixando-se cair numa incerteza de se o amanhã ainda irá chegar.

E ao fechar a porta atrás de mim ao sair, encontro-me com mil porquês de manter assim essa vida de nós atados. Uma vida de vontades inesperadas. Encontro-me com cor e sentido para coisas sem razão. Encontro-me desorientada, porém, bem certa de onde percorrer.

Apesar de tudo, talvez te ver dormir seja meu calmante.


Curitiba, 24 de abril de 2010. 15:58

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Enquanto o trem escorrega pra Milão.

O trem vai deixando essa cidade para trás, cidade dura. Dura como pedra. E afinal, eu só quis descobrir todo esse tempo, quais histórias eu vim à procura. Mas a velocidade desse trem não se importa se me dói ou não deixar lembranças ou não deixar nada, ele só quer me levar pra onde o céu é maior.

E se o céu era maior aqui? Ou melhor, havia céu? Eram nuvens, era vida. Era vida? Eu era a senhora confusão e ainda sou, mesmo nesse trem cheio de pessoas e nenhuma história ou nenhum ouvido para escutar. Minha cabeça lateja tanto, mas tanto. Acho que estou cansada dessa paisagem, me leve pra outro lugar, cansei de só ver o norte.

O que temos para nós mesmos, além de nós? Agora eu sei mais do que nunca, que naquela cidade eu lidei com os demônios, com os dragões, lutei com as tempestades. Lutei com o mundo que me propunham. Mas senti falta todos os dias, de um cheirinho gostoso, do cheirinho de nós.

Hoje está nublado e a chuva não quer cair, é como criança que quer brincar de ser forte. Nem muito frio faz, porém deixa a Europa com cara de Europa. O mundo corre pra se esconder da dor e ninguém para pra pensar que fugir não é a melhor solução. Mas fugir do que? Da vida, eu diria... Da vida que criamos, da vida que criei.

A gente brinca de ser grande, de não se importar. Mas quando tudo acaba o que mais queremos é um abraço, um colo. Mesmo quando nos decepcionam. A vida é essa praga, que vai embora quando você menos espera, que te faz voltar.

Voltar de onde e para onde? Voltamos um dia, para falar italiano, para rir de coisas absurdas. Para chegar no meio do nada e ver o coração quebrado. Não, ninguém o quebrou, apenas nunca o colaram de volta.

Aquela cidade está longe agora, tão longe. Eu nunca me entendi com eles, ou melhor, com aquela casa. Onde dias de tristeza me tomavam conta. Me importar pra que? A solidão destrói do mesmo jeito e vai ferir, fazer sangrar da mesma maneira.

Os abraços que não dei, os beijos que contei, as risadas que compartilhei, contaram histórias para décadas. Onde me orgulharei de cada descoberta, cada segundo. Mesmo das dificuldades que enfrentei e superei. Porque na verdade, não estamos nunca sozinhos. Sempre tem alguma mão que segura a nossa.

Hoje o dia vai indo embora, assim como sempre acontece. A cidade vai cansando e logo mais, se preparando para dormir. Mas já não tem mais problema, que os dias não choram. A ausência não dói, pois amanhã, eu estou voltando pra casa.


No trem para Milão, 12 de janeiro de 2010. 12:58

domingo, 11 de abril de 2010

Seus passos arrastados.

Eu coloquei a sua melhor camisa e enfeitei meu pulso com o seu relógio. Saí bonita, só para me mostrar ou talvez, te mostrar. Segui tranqüila, enquanto sua camisa ainda mantém seu perfume e seu relógio notoriamente, ainda guarda suas digitais. Guardam resquícios seus, quando nesse mundo você já não caminha mais.

Deixei a saudade chegar devagarzinho e até se acomodar. Porém, foi só fechar os olhos que já senti aquele cheiro de cigarro impregnando minhas narinas e o barulho de seus passos arrastados, depois de um dia tranqüilo. Escutei sua voz, como se você estivesse aqui do meu lado, fazendo a mesma velha pergunta “como vai a escola?”. Vô, a escola vai bem, minha vida vai bem.

Às vezes eu me lembro de chorar a sua falta, porém muitas outras, eu me lembro de sorrir porque você sempre gostou do som da minha risada. Eu não tive tempo de sorrir bonito pra ti uma última vez, vô. E isso me mata todos os dias, todas as noites quando meu sono não vem.

Sabe, ainda não tive coragem de voltar na sua casa, vô. Não tive. Porque ela sem você não tem sentido. É como querer escrever e não ter uma caneta ou um lápis. É como escutar música e não ter um rádio. Ir lá e não te ver é a solidão se sentando ao meu lado, as lágrimas me dominando. É a saudade irreversível gritando.

Os seus passos ainda estão rangendo a madeira do corredor, suas malas ainda estão feitas do lado da porta. Meus braços ainda estão abertos te esperando, para um último encontro.

- Minha eterna maneira de escorrer sentimentos.


Curitiba, 11 de abril de 2010. 19:18

quinta-feira, 25 de março de 2010

No cor-de-rosa.

Ela deitou sua cabeça no travesseiro e sentiu aquele cheirinho. Aquele perfume encantador que ao mesmo tempo fascinava e confundia. Era estranho sentir aquele cheiro e sentir penetrar em sua mente mil tipos diferentes de pensamentos, mais estranho ainda era que todos eles eram bons.

O mundo estava se colorindo aos poucos e o preto no branco, tão clichê em sua vida, estava se tornando um pouco esquecido. Começou a ficar horas a fio, não mais pensando sobre o que fazer, mas sim, sobre o que viver, aonde ir, o que falar. Se desgastou no encanto e deixava se desgastar ainda mais.

Estava se renovando. Renovando pequenos detalhes, que havia esquecido que eram necessários. Passou a fazer de cada beijo e abraço, uma urgência. Deixou fazer da vontade de ver, uma ansiedade para o tempo passar rápido, mas também, para fazê-lo andar de vagar, para poder se deliciar no desejo de querer um novo encontro.

Se o relógio girava ou não, pouco importava. Se contentava em admirar as estrelas e esperar o celular tocar, numa espera de sorrisos discretos e talvez fizesse o olhar brilhar um pouco mais ou simplesmente, torná-lo mais hipnotizante.

Hipnotizante, no entanto, era aquele cheirinho. Aquele perfume encantador, que lhe trazia algo bom. Algo vivo. Algum suspiro gelado, refrescando a sua vida. Dando vida novamente a um coração quebrado tantas vezes.


Curitiba, 25 de março de 2010. 18:36

segunda-feira, 22 de março de 2010

O pouco que nos sobra.

Talvez fosse para restar pouco tempo mesmo, tão pouco que não tivéssemos tempo de sorrir uma última vez. Ou talvez houvéssemos tempo, mas não olhamos para trás, pois temos esses costumes de achar que olhar para trás é perda de tempo. Mas quem sabe não seja, não quando se é para dar um último sorriso. Mandar um último beijo.

Acho que o tempo voa demais e o deixamos escorrer por nossas mãos, como areia quando a pegamos em dias de vento. E o tempo não pode ser o nosso amigo, caso fosse não teria graça, não veríamos graça.

O tempo é para se esquecer e não para ser contado no relógio e nem no calendário. O tempo foi feito para ir embora, rápido ou devagar, porém para fugir de nós. Para deixar o último dia acontecer, para despedidas chegarem com datas não marcadas. Para até mesmo nos arrependermos de não termos dado um último abraço, dado um último beijo.

Nos despedimos das vidas que já foram e das saudades que chegaram, culpamos o tempo por não termos tido tempo de ter dado um último adeus. Ter escutado o último suspiro. Culpamos o tempo por não ter esperado um pouco mais, para termos segurado a mão e falado um último “eu te amo”.

O tempo nos rouba horas, segundos. Nos rouba vida. Nos deixa admirar o horizonte, como se algo pudesse aparecer, como se desse para trazer momentos passados ou simplesmente nos trazer mais tempo. Mais tempo para o horizonte que teremos a seguir.

Afinal, não é esse o conselho sempre tão bem dado? Deixar os olhos no horizonte. Então me deixe admirá-lo e deixe acreditar que trará mais tempo. Mais tempo para amar, me despedir... Mais tempo para viver.


Curitiba, 22 de março de 2010. 22:25

sábado, 20 de março de 2010

Pequeno impróprio.

Mas talvez o que fosse extremamente difícil era a maneira como ela se esquecia. Se esquecia nos olhos dele, na sua voz e nos seus abraços. Ela conseguia se esquecer até mesmo no seu esquecimento. Por mais que tentasse, era mais fácil sumir ou simplesmente deixar. Deixar a vida andar, o amor passar, a dor cicatrizar. Era mais fácil se perder nos olhos que viviam se desviando dos dela, do que encarar que em sua mão havia o seu coração devolvido, com apenas três palavras "não me siga".

Curitiba, 20 de março de 2010. 20:48

sábado, 6 de março de 2010

Desabafo de alguém irritada.

Me dei um tempo agora. Quarenta minutos para escrever sobre alguma coisa que tem me perseguido. Tenho exatos quarenta minutos para despejar cor ou sangue, numa folha de papel virtual, enquanto a tinta no meu cabelo faz efeito.

Esse é um dos problemas de querer virar ruiva artificialmente, a cada vinte dias lá vou eu passar a tal tinta no cabelo. E quando paro para pensar, a cada retoque que dou nos meus cabelos artificialmente ruivos, alguma coisa na minha vida mudou. Qualquer coisa, de vez em quando importante e outras não, mas sempre mudou.

Quando paro para pensar, observo que aventuras ou desventuras me cercam a cada vinte dias ou um mês. Reparo que dentre este período de tempo eu cometo erros ou acertos, muitas vezes até mesmo os dois. Encontro uma pessoa e daí, quando já fiz mil planos, eu a desencontro. Aí, me sobra qualquer mesa de bar e uma cerveja bem gelada para compensar.

Com o tempo, comecei a deixar de contar segundos e passei a contar as horas. Hoje, por incrível que pareça, não consigo tempo para fazer tudo o que eu gostaria, num só dia. Mas talvez eu não ache esse tempo, porque eu perco tempo demais. Perco tempo com nada a fazer, nada a assistir ou chorando o passado, de vez em quando, até mesmo voltando ao passado.

Afinal, de onde tiraram que “voltar” ao passado é algo bom? Acho que me tornei muito dura e passei a acreditar que temos de seguir em frente. Nada dessa baboseira de voltar atrás, de pensar de novo. O que está feito está feito e isso não cabe a ninguém, apenas a nós. Voltar aos sentimentos, relacionamentos, momentos, vidas! Voltar ao passado é algo para fugir do futuro, do seguir em frente.

No momento, acho que meu amigo tinha razão, ao dizer que não adianta olhar velhas cartas, pois são janelas do passado e temos de nos manter focados no futuro. Esse era o principio do meu intercâmbio, por exemplo. Olhar para frente, ao invés de deixar o passado nos tomar. O passado já foi e lá ficou, sabemos que lá ficou.

Talvez por isso, hoje, eu queira ir para frente. Retomar um caminho não é mais o apropriado para mim. Quero algo novo, totalmente novo, como eu já havia feito um tempo atrás. Correr atrás de algo que se encaixe a mim e aos meus objetivos de vida. Cansei de brincar de viver e achar que assim está bom, quando não está. Quero algo a mais.

Afinal, de nada adianta querer voltar ao passado, pois mesmo que o consiga fazer, o passado no presente, jamais será a mesma coisa que um dia foi. As coisas sempre mudam, sempre. Mesmo quando queremos que continuem iguais.
E veja só, lá se foram meus quarentas minutos.


Curitiba, 6 de março de 2010. 17:12

quinta-feira, 4 de março de 2010

Sobre qualquer coisa.

O dia já amanhece nublado, nessa rotina cansativa de olhos molhados. Toda cor do mundo transforma a vida em preto e branco, sem chances nem para o cinza. Acho que é cansaço da mesma porta abrindo e fechando, fazendo um barulho assustador, que já acostumou. Tanto faz, agora não importa mais, já virou rotina.

Rotina remendar o coração e fugir logo depois de tantos erros. Rotina começar de novo, achando que o ponto zero é o melhor jeito de se ter novas coisas. Falta de força de vontade, que se aloja logo ao lado, toda vez que os olhos cansados proclamam trégua com a realidade e insistem em me levar ao mundo dos sonhos. Ao meu paraíso, escrito por mim mesma.

É inundação do passado e medo do presente, é esperança em vão do futuro. Águas passadas capazes de cessar os fogos de hoje, capazes de afogar sonhos. É nesse amor de solidão que se aproxima, que traz o céu ainda mais para longe. Que faz com que estrelas não cantem ao anoitecer.

Descansa a caneta, joga tudo na gaveta e passa a chave. Deixa escorrer sangue e água, mas não deixa afogar-se neles. Faz-me pensar sobre o amor... Amor? Que amor?


Curitiba, 4 de março de 2010. 22:29.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Abram o paraíso, meu avô está chegando.

Poxa vô, não, te chamarei de dido, como a minha vida inteira te chamei. Dido, vô em ucraniano. Poxa dido, como você tá, hein? Você estava me esperando, né? Era por isso que você queria tanto que eu voltasse, porque você queria me ver uma última vez. Mesmo que eu tenha quebrado a promessa do “volto semana que vem”.

Ah dido, nunca tive coragem de te ver no hospital. Era dolorosa a idéia de ver meu guerreiro, ali, beirando ao paraíso. Acho que nunca imaginei que o senhor, meu guerreiro, iria perder uma batalha. Você era tão invencível, dido! Cheio de vida, mesmo quando as coisas não iam tão bem. Quando seu pulmão já estava machucado e seus problemas se aconchegavam.

Ah dido, eu me lembro da sua voz grossa, perguntando como estou. Dos seus abraços fortes, que sempre me acolhiam, dos almoços de domingo, que você insistia sempre em ter uma boa carne e ter aquelas músicas gaúchas horrorosas. Das vezes que o senhor gostava de beber demais. E como você gostava de uma cervejinha aos domingos!

Eu me lembro dos passos arrastados pelo chão de madeira na sua casa. Casa que você construiu com as suas próprias mãos, quando mais novo. Eu me lembro do Jornal Nacional que assistia antes de dormir e que você quase dormia assistindo. Ah dido, eu lembro que você acordava tão cedo e nunca fazia barulho, quando eu dormia na sala.

Ah meu dido, meu guerreiro. Ontem eu fiquei horas a fio chorando no seu paiol. Estava tudo exatamente do jeitinho que você deixou. Sem nenhuma mudança. Como se tudo ali, estivesse simplesmente te esperando, para terminar o armário que estava fazendo.

E eu sentei naquela sua cadeira e fiquei olhando o nada, conversando em voz alta contigo. Dido, eu nem sei se você escutou, mas eu conversei. Perguntei tantas vezes porque você foi embora tão cedo! E você queria tanto que eu voltasse da Itália, dido. Aí, eu resolvi voltar e lá no fundo, era por ti! Você me esperou, né dido? Você só queria que eu voltasse, para aí partir.

Você quis se despedir, dido. Eu sei. Você me deu um último abraço forte, ah se eu soubesse que seria o último eu teria ficado um pouco mais. Pedido um café e feito você e a baba me contarem suas histórias, sobre a nossa família ucraniana. Eu teria pedido para você me ensinar algo mais, do que só baba e dido em ucraniano.

Ah dido, se você soubesse a falta que está me fazendo! Cada centímetro do meu corpo está doendo e meus choros se misturam com fajutas tentativas de gargalhar. Volta meu guerreiro, volta pra mim. Eu sinto a sua falta. A vida descoloriu, perdeu a graça.

Acho que ainda não acredito, sabe dido? Não acredito que você foi embora. E eu não pude nem me despedir. Fiquei com tanto medo de te ver deitado, incapacitado numa cama de hospital. Eu nunca tive a chance de perguntar se eles te tratavam como rei, assim como o senhor é. E você tinha até feito as malas para voltar para casa, né dido?

Porque me deixou, hein? Eu tô com saudade. Saudade de você me ensinar a martelar e a serrar uma madeira e de você sempre comer com o prato fundo e colher. Estou com saudades de te ver, ao chegar à casa sua e da baba, sentado na mesma velha cadeira, fumando seus cigarros. Entrando, no final da tarde, apenas para tomar o café e comer o pão, que a baba fazia com tanto carinho.

Eu estou te procurando tanto em cada canto, mas eu não te acho! E o lugar onde mais eu te encontrei, foi no paiol. Eu me despedi do senhor lá, dido. Foi lá. Sei que entre choros e risadas, será lá que eu irei te encontrar, sempre que eu quiser. Lá é onde o senhor vai estar. É lá.

Ah dido, se eu pudesse ter dito a ti que eu te amo, uma última vez. Só isso. Eu não quis te dizer isso, ao te ver ali, imóvel. Sem poder me olhar, sem nem saber que eu estava ali. Dido, você foi grande e sei que algo lá em cima está cuidado de ti, eu sei!

Mesmo que eu não acredite em Deus, você acreditava e a baba disse que Deus é grande e sabe o que faz. E se para você ele existia, eu sei que ele tá te protegendo e te dando todo o paraíso que você sempre mereceu. Espero que cuidem de ti, dido. Mais tarde a gente se encontra, eu sei que sim.

Eu te amo muito dido e será difícil sem você. Já está sendo. Eu te amo além do muito, te amo mais que o incompreensível. Não me deixe, tá dido? Não me deixe jamais.

“Meu guerreiro largou a espada e saudade foi o que deixou”.


14 de fevereiro de 2010, meu guerreiro, meu dido descansou em paz.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Perdi o dom da escrita, por enquanto.

Perdi o dom de escrever, assim como perdi o dom de dormir nas madrugadas. Perdi o dom de escutar risadas e daí escrever sobre elas. Sobre o som, sobre o mundo que se colore ao efeito de uma única pessoa, uma única voz. Um único sorriso.

Tenho trocado enormes xícaras de café, por enormes taças de sorvete. E cada vez mais, tenho perdido a fome durante o dia, junto com a vontade de sair. De vez em quando deduzo que esse sol me entedie ou talvez esse calor simplesmente me faça ter vontade de ficar. Ficar e respirar um pouco, ficar e respirar quase nada.

Sei que eu tenho perdido o dom de transformar sentimentos em palavras. Estou me sentindo trancada, sufocada. Sem inspiração! O que seria a maior mentira que eu poderia contar, visto que minha inspiração tem sido cada vez mais frenética. Mas acho que troquei as palavras, por cores numa tela branca. Por azuis, vermelhos e laranjas. Por roxos e amarelos.

Ouço a porta batendo e lá vou eu atender de novo e novamente, meu sorriso não se abre e nem sinto cheiro de rosas novas. Novamente não é ninguém interessante, assim como nunca tem nada na televisão, ultimamente nada tem batido na porta. Assim me abrigo nessa casa faz uma semana, exatamente. Parece mais fácil, não?

Fácil do que, eu gostaria de saber. Andar de pijama o dia inteiro e devorar livros, com tal voracidade que até ganho da minha irmã. Engolir programas de televisão e filmes esquecidos, até então, na prateleira. Molhar os olhos com tempestades de lágrimas ao ler velhas cartas, velhos textos. E toda madrugada perder o sono, simplesmente por perder. Simplesmente por não querer dormir.

Mas quando eu fecho os olhos, ah! Quando eu fecho os olhos, eu tenho aquele mundo inteiro aqui comigo, todas aquelas risadas, aquelas vozes. Quando eu fecho os olhos, o mundo inteiro pára e me alucino dentro dos meus próprios sonhos. E quando o sono vai embora e eu volto a realidade, apenas pego novamente aquela caneta e aquele papel, para fazer listas e roteiros, de todas aquelas viagens.

Eu já não sei escrever, perdi o dom, porque a inspiração continua aqui. Só esqueci como se coloca palavras atrás de palavras. E quer saber, não vou mais tentar ficar aqui por hoje, vou ali do lado, acabei de me lembrar de um filme de terror pra assistir e quero anotar o nome antes de me esquecer.


Curitiba, 12 de fevereiro de 2010. 2:49 am.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Todos nós precisamos de amor.

Os inimigos da solidão teimam tanto em não serem sozinhos, que procuram sempre serem rodeados de pessoas, de risadas. Procuram tanto, que nunca encontram e no meio de uma multidão absurda, se sentem sozinhos. É como se nada bastasse – e talvez, isso fosse verdade.

Intrigante noite estrelada, encantada eu diria. E esse calor insuportável não vai embora, não quer ir. É o aquecimento global – diriam os bons curitibanos. Eu concordaria, mas acrescentaria dizendo que é também a solidão. Solidão dos infelizes, dos solitários. Dos buscadores de felicidade alguma.

E não há ninguém para dividir um sorvete ou caminhar na praia, deixando as ondas baterem nos pés. Não há ninguém capaz de dividir uma cama, numa noite de extremo calor. Mas é fato, é preciso haver calor, para gostar do frio. De estar longe, para começar a gosta de casa. Precisa ir embora, para querer voltar.

Acho que a solidão, assim como qualquer sentimento, é como um ventilador. Você o deixa ligado, faz aquela brisa e quem sabe, até acaba abafando ainda mais o quarto. Porém, um belo dia, você o desliga. Aí a brisa vai embora, deixando o calor do dia te sufocar ou o frescor da noite te acalmar.

Erramos tanto, que acabamos pensando que ser sozinho é a melhor. Mas espera, melhor para que mesmo? Somos tão egoístas a ponto de querer serenidade, tranqüilidade e apenas em nós? Podemos não precisar da solidão, podemos não precisar ter medo do amor.

Sinceramente, podemos não ligar o ventilador numa noite fresca, e apontá-lo diretamente para a janela, deixando o quarto abafado, ao fazê-lo afastar o novo ar. Podemos desligá-lo e deixar o frescor entrar, dormir olhando para a lua. Podemos não nos importar se amanhã será como esperamos ou não.

Não precisamos ser sozinhos, para sermos mais feliz. Precisamos de alguém, que nos apóie, que converse sobre qualquer coisa. Precisamos de mais magia, de mais filmes e mais músicas. De dançar a noite inteira e deixar a perna doer no dia seguinte. Precisamos de amor, mesmo que a sua forma de amar, seja a mais complicada possível.


Curitiba, 3 de fevereiro de 2010. 3:14

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Eram os mesmos cheiros.

Nem esperou até todos saírem do carro, simplesmente saiu correndo. Não queria paciência numa hora daquelas. Já havia esperado muito tempo! Queria ir depressa, correr como o vento. Queria abrir aquela porta... Queria estar em casa. E correu, ultrapassando todos os degraus que via na sua frente. Foi correndo e deu de cara com aquela porta.

Acho que nem pensou, rodou a chave, encostou a porta e passou correndo. Entrou no quarto, o quarto tão esperado. Estava tudo ali, no mesmo lugar. Nada tinha mudado, talvez algumas coisas mais organizadas, mas ainda era o mesmo quarto. Aquele quarto cheio de coisas, onde sempre conseguia mais espaço. Sempre.

Estava tudo em ordem, finalmente. Nem pensar conseguia. Queria rir, contar, conversar. Queria ter tudo o que não teve nos últimos dias. Fez todos irem, mas também fez todos voltarem mais tarde, só para vê-la. Era saudade, de tudo aquilo. Daquele mundo que ela tinha deixado de lado algum tempo. Era saudade, nossa, que saudade!

Respirava fundo e seus olhos estavam cansados, cansados de sono, de preguiça. Mas não precisava dormir, precisava ver tantas coisas, mas tantas. Precisava daquele ar, daquela confusão. Precisava deles e não queria perder um segundo, não! Não podia!
Contemplou a vida, que de novo, manifestava em seu corpo. Contemplou a saudade, indo embora, toda atrapalhada, ao ver os sorrisos, com todos eles. Era um alivio inexplicável, era a melhor coisa, depois que veio a pior. O melhor tempo, depois daqueles meses, foi estar ali, com eles. Sentir aquela bagunça, aquele lugar apertado. Aquela vontade de rir.

Mas foi abrindo a janela, quando já era de noite, e contemplando aquela mesma visão que tinha visto a sua vida inteira, que ocorreu o seguinte pensamento: “nossa, eu estou em casa." Falou olhando para dentro do quarto, onde ao seu lado, estava um garoto que a admirava – ou apenas a olhava. Mas olhava com um sorriso gentil, carinhoso. “É sim, está em casa”, fazendo com que ela pulasse em seus braços, o derrubando na cama.

É, ela finalmente estava em casa.


Curitiba, 19 de janeiro de 2010. 23:24

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Vira o ano vai, tem problema não.

Mudou o tema – ou talvez apenas alterado alguns detalhes. Deixei os desejos de lado, porque eles não se realizam como pensamos. Joguei pro lado as esperanças e agora, o que me encontrar simplesmente me encontrou. Os dias mesclam entre rápido e devagar, mas eu sei muito bem que daqui a pouco, o ano vai acabar de novo. De novo, cansamos dos mesmos dias repetidos, das mesmas histórias doloridas.

E o colorido, cadê?! Ichi, esse eu deixei em casa! Não trouxe para cá não, porque trazer daria perigo pra se tornar preto e branco. Resisti até as doenças de saudades! Onde o pensamento fica fraco e a gente só quer dormir, onde qualquer gripe vira coisa forte. Porque quando se tem saudade, você vira fraco. Dolorido. Você vira cansado da vida.

Mas os meses não cansaram de passar e foram escorrendo igual a leite derramado. Assim como as horas gostavam de passar devagar, só para desfilar no relógio. Desfilar agonia de estar tão longe de casa. Mas o ano não cansou e foi andando, foi andando. Quando menos eu esperava, o fim gostava de vir se apresentar, só para dizer que estava chegando.

Vinha com um deslumbre só! Trouxe neve, sorriso e novidades. O fim trouxe até mais saudade, porém dessa vez, seria saudade das pequenas coisas que eu vou deixar aqui. O fim trouxe sorriso, sinceridade. O fim conseguiu até mesmo, trazer alguma tranqüilidade. Ah, tranqüilidade gostosa dos dias. Últimos dias de um ano complicado.

Chegou colorindo, no preto e no branco, alguma cor – mesmo que discreta. Trouxe um pouco de calor pro coração gelado e até mesmo esperança, pra desesperada. O ano nasceu sorrindo pra mim, no meio do frio. Trouxe surpresas, não do mundo, mas de mim mesma. O ano nasceu manhoso.

Pela primeira vez, quis ver o sol do verão nascendo. Um calor de colocar um vestido e ir caminhar, sem hora pra voltar. Olhar pro céu azul e sentir o bom e velho calor brasileiro, fazendo eu me sentir em casa. Ah, esse ar frio europeu cansa, mas cansa! Não sabe como cansa. E a neve é linda, deixando tudo branco, as placas nas ruas parecerem pequenas. Mas a neve escorrega e é difícil andar nela, quando ninguém esta por perto pra te segurar.

A gente corre pra se esconder, mas quando se esconde, pergunta por que se escondeu. Porque se esconder da vida, não vale a pena. Tem mais é que abraçá-la, vive-la. E afinal, nenhuma lágrima é assim inútil, que por cada lágrima que derrubamos algo de bom nos espera. É simples, é a física da vida, sem cálculos e derivados.

Desmancha meu sorriso, vai. Pode desmanchar, eu não me importo! O ano veio sorrindo pra mim, porque eu quis ver o sorriso vindo dele! Então desmancha, faz chorar. Mas algo maior, sempre nos espera. Outros sonhos virão, outras realizações virão. A vida continua!


Valdagno, 5 de janeiro de 2010. 20:52