sexta-feira, 13 de julho de 2012

Tão acostumada sou, que quando pesa...


Antes mesmo da porta fechar com um baque, ela já havia jogado seu casaco e sua bolsa no sofá da sala, andou até o quarto e se jogou na cama. Era a bebida. Não se lembrava do que, nem de o porquê e nem como, mas ela havia chegado em casa com um enorme peso no coração. Algo tão pesado e consumidor, que nem conseguia respirar normalmente. A luz, a televisão, a cortina e o quadro giravam eternamente, como se estivessem numa roleta russa. Ou ela estaria numa roleta russa? Dormiu.

A ressaca a acordou com língua seca às 8 horas da manhã. Depois de tomar um enorme copo de água, ela sentou no sofá e reparou que além da dor de cabeça, algo ainda pesava em seu coração. Era como se fosse ânsia, mas talvez isso fosse consequência das várias bebidas ingeridas na noite anterior, mas também poderia ser solidão. Esse peso era como uma pontada. Algo angustiante, entalado, preso. Seus olhos se fechavam e logo em seguida abriam, agora era a sala que parecia girar.

Lentamente se levantou do sofá e seguiu para a varanda, sentou-se na cadeira, acendeu um cigarro e enquanto as cinzas caiam no chão, ela fechava os olhos e deixava o sol esquentar seu corpo frio pelo vento do inverno. Deixou escorregar o tempo, pensamentos, vontades. Ainda sentia seu peito pesar, era uma sensação horrível. Tão horrível que nem se acomodava na cadeira, assim como não se acomodou no sofá e muito menos na cama.

Na cama, porém, enquanto encarava o teto branco procurando algo escrito nele, dando o motivo de tal peso do peito, ao girar um pouco a cabeça para a direita, encontrou marcas de algo que acontecera ali. Ralas marcas de dedos, feito com batom vermelho, coloriam a cabeceira da cama. Sentiu então o corpo sucumbir dez metros para baixo, seu coração pesou tanto, que levou até a sua alma. O que precisava ser entendido, enfim foi e o coração pesado, era a saudade apertada dele.

Pegou o telefone, discou sem nem pensar os números. Tocou, tocou. Nada. Tentou de novo. Tocou, tocou, tocou. Secretária eletrônica. Desistiu. Voltou a deitar as costas na cama – porque liguei, ele está viajando. Volta só daqui quatro dias. Virou para o lado, olhou a foto dele e dela, sentados numa praia e sorrindo. Ela sorriu pra foto. Respirou. Tentou de novo o telefone. Secretária eletrônica. – Alô, meu bem, meu coração pesou hoje. No começo não percebi, mas agora... Volta logo, por favor? Cansei de pesar sozinha.


Santiago, 12 de julho de 2012. 23:16

terça-feira, 10 de julho de 2012

Do lado de fora da porta.


Você passa seus dedos quentes nas minhas costas, faz desenhos de arranhões nelas e pinta de mordidas roxas as minhas coxas. Me deixa de lábios vermelhos e olhos brilhantes. Você deita seu corpo quente ao lado do meu gelado e diz, assim mesmo, que as coisas vão fluir, se eu deixar fluir. Você se levanta da cama e vai resolver a sua vida, enquanto eu fico ali estirada, esperando um próximo beijo, um próximo gemido de gozo. Fico esperando entre as cobertas já cansadas de nós dois, um próximo momento juntos.

Brinco de não haver vida por detrás da porta e que somos os únicos que sobrevivemos essa realidade tão amarga. Pois você deixa a minha vida mais doce. Hoje ou amanhã se torna um e sempre é cedo, mesmo quando sabemos que é tarde. Afinal, o que vivemos sempre é tarde. Às vezes brincamos de casinha, outras vezes brincamos de morar um em cada cidade. Levamos uma vida meio doida ou até mesmo doída, se formos pensar em determinados casos.

Mas aí as coisas acontecem, no dia seguinte você chega em casa e eu sento no seu colo, só porque eu acho legal sentar. A gente ri de algo bobo e dividimos uma cerveja, um cigarro, uma história. Quando menos percebo estamos aqui ou ali, estamos lá, mas estamos. Sempre estamos. Mesmo quando o mundo nos impede de estar, nós estamos. Se a música acaba, você coloca outra, se a cerveja acaba, nós abrimos outra. Se o assunto desaparece, a gente se encaixa perfeitamente.

Você me consome inteira, você me bebe feito um líquido doce, enquanto eu te absorvo absolutamente, pra te ter sempre comigo. E tudo isso nos torna maiores, tão maiores que às vezes simplesmente tampamos os buracos que fazemos – ou eu faço – e reconstruímos a calçada. Sutilmente, começamos a construir muros. Verdadeiras muralhas, das quais podemos brincar que lá fora não existe mundo. Nada existe, nem o tempo, apenas nós.


Curitiba, 10 de julho de 2012