quarta-feira, 21 de abril de 2010

Enquanto o trem escorrega pra Milão.

O trem vai deixando essa cidade para trás, cidade dura. Dura como pedra. E afinal, eu só quis descobrir todo esse tempo, quais histórias eu vim à procura. Mas a velocidade desse trem não se importa se me dói ou não deixar lembranças ou não deixar nada, ele só quer me levar pra onde o céu é maior.

E se o céu era maior aqui? Ou melhor, havia céu? Eram nuvens, era vida. Era vida? Eu era a senhora confusão e ainda sou, mesmo nesse trem cheio de pessoas e nenhuma história ou nenhum ouvido para escutar. Minha cabeça lateja tanto, mas tanto. Acho que estou cansada dessa paisagem, me leve pra outro lugar, cansei de só ver o norte.

O que temos para nós mesmos, além de nós? Agora eu sei mais do que nunca, que naquela cidade eu lidei com os demônios, com os dragões, lutei com as tempestades. Lutei com o mundo que me propunham. Mas senti falta todos os dias, de um cheirinho gostoso, do cheirinho de nós.

Hoje está nublado e a chuva não quer cair, é como criança que quer brincar de ser forte. Nem muito frio faz, porém deixa a Europa com cara de Europa. O mundo corre pra se esconder da dor e ninguém para pra pensar que fugir não é a melhor solução. Mas fugir do que? Da vida, eu diria... Da vida que criamos, da vida que criei.

A gente brinca de ser grande, de não se importar. Mas quando tudo acaba o que mais queremos é um abraço, um colo. Mesmo quando nos decepcionam. A vida é essa praga, que vai embora quando você menos espera, que te faz voltar.

Voltar de onde e para onde? Voltamos um dia, para falar italiano, para rir de coisas absurdas. Para chegar no meio do nada e ver o coração quebrado. Não, ninguém o quebrou, apenas nunca o colaram de volta.

Aquela cidade está longe agora, tão longe. Eu nunca me entendi com eles, ou melhor, com aquela casa. Onde dias de tristeza me tomavam conta. Me importar pra que? A solidão destrói do mesmo jeito e vai ferir, fazer sangrar da mesma maneira.

Os abraços que não dei, os beijos que contei, as risadas que compartilhei, contaram histórias para décadas. Onde me orgulharei de cada descoberta, cada segundo. Mesmo das dificuldades que enfrentei e superei. Porque na verdade, não estamos nunca sozinhos. Sempre tem alguma mão que segura a nossa.

Hoje o dia vai indo embora, assim como sempre acontece. A cidade vai cansando e logo mais, se preparando para dormir. Mas já não tem mais problema, que os dias não choram. A ausência não dói, pois amanhã, eu estou voltando pra casa.


No trem para Milão, 12 de janeiro de 2010. 12:58

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