Mas não. Não que eu possa dizer algo, mas pensei, e não, eu
não disse. Eu não disse quando acordei ao seu lado, vi tua barba encostando em
meus ombros e teus braços – musculosos demais para mim - me abraçando num sutil desejo de ficar mais
cinco minutos. Você não abriu a porta do quarto e sei, muito bem, que foi
simplesmente por medo de encontrar meus pais que já te conhecem muito bem, mas
nunca te viram segurando minha mão. Você também não quis levantar tão rápido – e era véspera de
Natal. Você não quis dizer “até hoje de noite”, mas deixou um último beijo meio
frio-meio quente, meio cheio de vontade de ser algo mais. Você suspirou.
Não, eu realmente não sei. Procuro você, mas é sem querer e
quando não te procuro, te encontro por aí. Pode isso? Eu não te assumo e você
não me assume, você só me abraça e pega a minha mão. Você desanda, diz que vai
parar, diz que não, mas é sempre sim. Você não me faz café, não me traz presentes,
você traz apenas você mesmo e mesmo assim está bom para mim. A gente se
entende, tem alguma conexão. Será que podemos nos permitir assim tanto? Você é
doce – até demais. Ainda procuro algum defeito em você que me faça desacelerar
quando vou ao seu encontro, mas não acho, eu não quero encontrar. Está tudo
bem, sereno, não acha meu bem?
Te encontro aqui, ali, lá. Te encontro dentro de mim, fora. Nossos
encontros são sempre com finais certeiros: minha cama. Temos até fevereiro e me
parece tanto tempo, mas também é pouco. Deixa eu brincar um pouco mais contigo,
deixa eu te fazer rir sem querer e procurar saída quando não tem. Eu não vou
ficar, eu não quero ficar. Não quero uma foto nossa num porta retrato, muito
menos os dizeres de que me ama saindo de seus lábios finos. Quero guardar teu
sorriso na memória e a maneira como em hipótese alguma, mesmo quando precisa, você
não disfarça. Não disfarça que eu tenho te roubado uma noite por semana. Também
não disfarça que quando eu sorrio, você sorri e aí sorrimos.
De você não quero seus músculos, nem presentes, nem amor.
Quero você, simplesmente. Deixa ficar então. À tarde não existimos, de noite
acontecemos e tá tudo bem, eu juro. De você eu não quero parceria pra cinema,
pra jantar, pra sofá a tarde inteira. Vamos continuar dividindo as cervejas. Não quero te apresentar como namorado – só de brincadeira - não
quero conhecer tua família, teus planos, não preciso fazer parte da vida intima
que você tem. Tá tudo bem, juro. Não preciso. Tão pouco eu preciso me
apaixonar, estou indo embora e ir é bem mais fácil quando não tem o que deixar.
Não quero ser a louca que sorri pra ti quando ninguém tá
olhando, mesmo sabendo que eu sorrio. Não precisa me contar o que vai fazer de
noite, com quem vai sair, se vai dividir a cama com outra mulher – mesmo que talvez divida e eu
nem goste de pensar. Mas vamos dividir o café, caso seja final de tarde, apesar
de eu preferir cerveja no verão, no inverno... Sempre. Também pode ser que eu
prefira estar com você, ao invés do carinha bonito e tatuado que eu sempre quis
beijar. Pois prefiro o teu sorriso confuso e cara de quem estava meio perdido
quando de repente me chamou para tomar uma cerveja no bar que a gente gosta.
Ah, pode ser também que algumas vezes a gente esteja um perto do outro, em bares diferentes, mas a gente prefira assim – sabe como é, é
mais fácil do que contar sobre nós para quem ainda não sabe. Enfim, você tem esses braços grandes demais que me abraçam num sutil
desejo de ficar mais cinco minutinhos. Não posso também – e nem quero – me
apaixonar pelo teu sorriso confuso de quem me chamou para tomar uma cerveja e
não sabia se podia. Acho, inclusive, que eu não poderia sorrir pra você,
enquanto a tua barba encostava em meus ombros e teus braços - musculosos demais para mim - me abraçavam na véspera de Natal. Nem poderia
imaginar como seríamos um casal bacana, daqueles que tá tudo bem, tudo bonito.
Nem imaginar que você podia estar imaginando, enquanto tua barba encostava em meus ombros e teus braços me abraçavam com gostinho de mais cinco minutinhos, como seríamos um daqueles
casais bacanas que tá tudo bem, tudo bonito, na
véspera de Natal.
Eu não, realmente não disse. Mas sorri e imaginei.
Curitiba, 28 de dezembro de 2014. 12.40