domingo, 28 de dezembro de 2014

Da véspera de Natal.



Mas não. Não que eu possa dizer algo, mas pensei, e não, eu não disse. Eu não disse quando acordei ao seu lado, vi tua barba encostando em meus ombros e teus braços – musculosos demais para mim  - me abraçando num sutil desejo de ficar mais cinco minutos. Você não abriu a porta do quarto e sei, muito bem, que foi simplesmente por medo de encontrar meus pais que já te conhecem muito bem, mas nunca te viram segurando minha mão. Você também não quis levantar tão rápido – e era véspera de Natal. Você não quis dizer “até hoje de noite”, mas deixou um último beijo meio frio-meio quente, meio cheio de vontade de ser algo mais. Você suspirou.

Não, eu realmente não sei. Procuro você, mas é sem querer e quando não te procuro, te encontro por aí. Pode isso? Eu não te assumo e você não me assume, você só me abraça e pega a minha mão. Você desanda, diz que vai parar, diz que não, mas é sempre sim. Você não me faz café, não me traz presentes, você traz apenas você mesmo e mesmo assim está bom para mim. A gente se entende, tem alguma conexão. Será que podemos nos permitir assim tanto? Você é doce – até demais. Ainda procuro algum defeito em você que me faça desacelerar quando vou ao seu encontro, mas não acho, eu não quero encontrar. Está tudo bem, sereno, não acha meu bem?

Te encontro aqui, ali, lá. Te encontro dentro de mim, fora. Nossos encontros são sempre com finais certeiros: minha cama. Temos até fevereiro e me parece tanto tempo, mas também é pouco. Deixa eu brincar um pouco mais contigo, deixa eu te fazer rir sem querer e procurar saída quando não tem. Eu não vou ficar, eu não quero ficar. Não quero uma foto nossa num porta retrato, muito menos os dizeres de que me ama saindo de seus lábios finos. Quero guardar teu sorriso na memória e a maneira como em hipótese alguma, mesmo quando precisa, você não disfarça. Não disfarça que eu tenho te roubado uma noite por semana. Também não disfarça que quando eu sorrio, você sorri e aí sorrimos. 

De você não quero seus músculos, nem presentes, nem amor. Quero você, simplesmente. Deixa ficar então. À tarde não existimos, de noite acontecemos e tá tudo bem, eu juro. De você eu não quero parceria pra cinema, pra jantar, pra sofá a tarde inteira. Vamos continuar dividindo as cervejas. Não quero te apresentar como namorado – só de brincadeira - não quero conhecer tua família, teus planos, não preciso fazer parte da vida intima que você tem. Tá tudo bem, juro. Não preciso. Tão pouco eu preciso me apaixonar, estou indo embora e ir é bem mais fácil quando não tem o que deixar. 

Não quero ser a louca que sorri pra ti quando ninguém tá olhando, mesmo sabendo que eu sorrio. Não precisa me contar o que vai fazer de noite, com quem vai sair, se vai dividir a cama com  outra mulher – mesmo que talvez divida e eu nem goste de pensar. Mas vamos dividir o café, caso seja final de tarde, apesar de eu preferir cerveja no verão, no inverno... Sempre. Também pode ser que eu prefira estar com você, ao invés do carinha bonito e tatuado que eu sempre quis beijar. Pois prefiro o teu sorriso confuso e cara de quem estava meio perdido quando de repente me chamou para tomar uma cerveja no bar que a gente gosta.

Ah, pode ser também que algumas vezes a gente esteja um perto do outro, em bares diferentes, mas a gente prefira assim – sabe como é, é mais fácil do que contar sobre nós para quem ainda não sabe. Enfim, você tem esses braços grandes demais que me abraçam num sutil desejo de ficar mais cinco minutinhos. Não posso também – e nem quero – me apaixonar pelo teu sorriso confuso de quem me chamou para tomar uma cerveja e não sabia se podia. Acho, inclusive, que eu não poderia sorrir pra você, enquanto a tua barba encostava em meus ombros e teus braços - musculosos demais para mim - me abraçavam na véspera de Natal. Nem poderia imaginar como seríamos um casal bacana, daqueles que tá tudo bem, tudo bonito. Nem imaginar que você podia estar imaginando, enquanto tua barba encostava em meus ombros e teus braços me abraçavam com gostinho de mais cinco minutinhos, como seríamos um daqueles casais bacanas que tá tudo bem, tudo bonito, na véspera de Natal.

Eu não, realmente não disse. Mas sorri e imaginei.


Curitiba, 28 de dezembro de 2014. 12.40

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